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As confissões de André Cruz

As confissões de André Cruz

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TENHO 32 anos, nasci em 1981, filho de pais jovens, inteligentes, que me ajudaram a perceber o mundo. Nasci no Porto, em Cedofeita, vivi em S. Pedro da Cova, terra mineira, até aos 12 anos, que o meu pai é de lá. Depois fui viver para Ovar. Aos 18 anos voltei ao Porto, para estudar design gráfico.

Desde muito cedo comecei a tocar e a ter um interesse enorme na música. E achei que ia ser músico, até perceber que estava em Portugal. Quando percebi onde estava, optei por fazer as duas coisas, design e música.

Sempre tive um grande interesse nas artes visuais, induzido pela música: em miúdo ficava horas a olhar para as capas dos discos de vinil dos meus pais. E fui parar ao design gráfico em consequência da música. Decidi tirar o curso de design gráfico e, paralelamente, continuar a tocar. E foi até depois do curso tirado que tive, se é que se pode chamar assim, alguma notoriedade com uma banda: Sizo. Tocámos em festivais: Paredes de Coura, lá em baixo no Optimus Alive. Tivemos um pequenino começo com alguma notoriedade e depois o volume de trabalho em design gráfico aumentou e comecei a deixar de ter a mesma disponibilidade. Preferi acabar com a banda do que arrastar uma coisa que não me estava a dar prazer.

Uma vez formado em design (na ESAD, Escola Superior de Artes e Design, Matosinhos), ainda estive um ano parado, a perceber o que ia fazer. Concretizei alguns trabalhos como freelancer. Trabalhei na R2Design, depois na Experimenta Design, na Bienal de Design, em Lisboa, depois com um professor meu, João Faria, designer no Teatro Nacional S. João. No fim de 2006 tive um convite para integrar a Casa da Música e trabalhar com o Stefan Sagmeister, autor que desenvolveu a identidade gráfica da Casa da Música. Na altura eu tinha 25 anos e achei que aquilo era óptimo para mim, e foi óptimo para mim, claro. E estou na Casa da Música desde então. O Stefan é uma rock star do design gráfico, uma figura muito conhecida no design de autor, numa vertente artística, mais de trabalho pessoal.

Além da Casa da Música tenho tido trabalhos paralelos: só concretizo os que me dão gozo, como o caso do Primavera Sound. E também faço música.

Quando entrei na Casa Música, a música audível ficou subalterna. A música visual passou a ter um papel preponderante. Eu acho, isto é sempre um bocadinho subjectivo, acho, por muita mágoa que tenha, ter mais jeito para a música visual do que para a música tocada.

Tenho destreza musical, técnica, não sou um compositor brilhante, acho-me mais capaz de compor visualmente, graficamente, do que musicalmente. Esta convicção também me ajudou a encarar a diminuição da importância da música tocada na minha vida. Neste momento, faço música por necessidade pessoal.

Na banda, era eu que compunha a maior parte das músicas. E também toco guitarra, principalmente. Mas nunca fui, sei lá, um Bob Dylan: tecnicamente fraquinho, musicalmente brilhante. Eu não tenho esse lado, tenho o lado técnico.

Na área musical sempre fui um autodidacta. Foi por mim que aprendi, ouvindo músicas e tentando tocar na guitarra, dava uns toques noutros instrumentos. Mas sempre fui autodidacta: comprava revistas que ensinavam umas coisas. Chego à música muito antes do design, como disse. Comecei a tocar guitarra aí com 11 anos, a ouvir Jimi Hendrix e a tentar fazer igual.

A minha preocupação principal é só a música. Para mim é estranhíssimo que as pessoas dêem mais importância à letra, ao poema, do que à música. Desde muito pequeno que só ouvia a música, não queria saber da letra. Se calhar só ouvia a música porque as letras eram fraquinhas. Mas sempre me interessou muito mais a música do que a letra. E há certas músicas que a algumas pessoas sem formação musical dizem muito pela letra, que me passam ao lado. É uma deficiência minha, estou atento aos pormenores rítmicos, aos pormenores harmónicos, aos pormenores melódicos, e a letra é secundária. Às vezes tenho pena.

Na forma como ouço música faço associações visuais. A música acaba por influenciar mais o design gráfico do que o inverso. Os padrões rítmicos, os padrões melódicos são para mim muito mais fáceis de traduzir graficamente do que o oposto, ou seja, pegar numa imagem e representá-la musicalmente.

Curioso, enquanto na música a letra é subalterna, dispensável, na articulação visual preciso do conteúdo, preciso da palavra e da mensagem. Trabalhar graficamente um oi, uma palavra muito básica, muito simples, com um conteúdo muito reduzido à partida, é um desafio. É um desafio dar expressão a este oi. É um bocadinho a poesia das formas tipográficas, embora um A sozinho não seja tão rico como trabalhar uma frase. É como fazer vários exercícios tipográficos com expressões, por exemplo com frases, citações de autores. É comum fazer jogos tipográficos e aí, claramente, o conteúdo da mensagem define o aspecto formal. Para mim é quase uma responsabilidade moral não deixar que a estética se sobreponha ao conteúdo da mensagem.

Fotografia de Augusto Baptista.

Publicado in http://azulcanario.blogspot.pt/

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