DESDE que nasceu, Miguel Gomes tem feito a sua vida entre dois polos: a freguesia de Cête, do concelho de Paredes e a cidade do Porto. Para nascer, a mãe preferiu os serviços da maternidade Júlio Dinis, em Massarelos, às mãos pacientes da parteira da terra. Mas logo que veio ao mundo retomou a Cête. Depois regressaria para conviver com os avôs maternos, conhecer a complexidade urbana e a imensidão do mar. Daí em diante, no fim das férias, das aulas e do trabalho o destino estaria traçado: Cête. Parece que visita a cidade para se lembrar da falta que tem da aldeia.
Por Paulo Moreira Lopes
1 – Data de nascimento e naturalidade (freguesia e concelho)?
Nasci a 19 de Dezembro de 1975, na freguesia de Massarelos, concelho do Porto. A minha mãe, nascida e criada no Porto, mas a viver em Cête, Paredes, quis ter-me (numa altura em que se nascia em casa, pelas mãos pacientes das parteiras) na maternidade Júlio Dinis, Porto. Reza a lenda que foi por pouco que não me chamava Peugeot, devido à ausência de auto-estrada, à sinuosidade da EN15 e à limitada velocidade da velhinha ambulância que trouxe a minha mãe.
2 – Atual residência (freguesia e concelho)?
Resido actualmente e desde os meus escassos dias de vida física em Cête, freguesia do concelho de Paredes.
3 – Escolas/Universidade que frequentou no distrito do Porto?
Comecei pela Escola Primária das Lajes (EB1 de Cête), passei pela Escola Secundária de Baltar e Instituto Superior de Engenharia do Porto
4 – Habilitações literárias?
Deformação em Engenharia Informática.
5 – Atividade profissional?
Desde o ensino, formação, actividades com crianças, automação e controlo industrial, gestão de produção, passando por administração e gestão.
6 – Em que medida o local onde viveu ou vive influenciou ou influencia o seu trabalho por referência a fenómenos geográficos (paisagem, rios, montanha, cidade), culturais (linguagem, sotaque, festividades, religião, história) e económicos (meio rural, industrial ou serviços)?
Embora nascido no Porto, foi com tenra idade (dias) que me desloquei ou, melhor, deslocaram-me, para Cête, onde cresci e de onde não saí. O Porto traz-me memórias de vitrines embaciados pelo fumo dos cigarros, a cara áspera da barba mal cortada do meu avô materno, o cubo de marmelada embrulhado em papel que a minha avó materna me dava quando a visitava, o mundo estranho e complexo das ilhas e das casas continente dentro das ilhas, as portas feitas de cortinados, o frio e os carros, os eléctricos e os tróleis, o claquear dos velhos comboios cor-de-laranja, os autocarros e o barulho do obliterador das senhas, a experiência da praia em tempos de férias, a saudade dos pais nas férias, o mar, a imensidão do mar.
Ainda que tenha estudado e, agora, trabalhe na cidade do Porto, levo comigo sempre as mesmas recordações que se adaptam aos diferentes espaços onde estou. A admiração que tenho por um cartão abandonado na lateral de uma igreja que se adivinha ser leito de alguém liberto das amaras da sociedade, é a mesma que nutro pelos buracos esculpidos pela natureza nas valadas dos montes, a erva calcada e uma meda de palha que serviu de abrigo a alguém que se tenha fugido da vida ou de um par de namorados fugidos da vida.
Fascina-me a ruralidade da cidade, assim como a citadina que se prende a uma aldeia, com tendências de modas que se implementam nas ruas despidas. A frescura dos vegetais e de quem os vende, porta a porta, na cidade. A candura de uma colónia, a nova roupa que se usa na cidade, pendurada sob o oleado da feirante ou à porta do pronto-a-vestir ou da modista.
Parece-me, ressalvo, parece-me que preciso de visitar a cidade para me lembrar a falta que tenho da aldeia, da ruralidade, das ruas mal empedradas, das pessoas nunca paradas ainda que imóveis, a certeza do nascer e do pôr do Sol, a procissão e as promessas em forma de andores móveis e ombros salgados pelo suor de um agradecimento a um orago.
De forma mais sucinta, a divisão entre aldeia e cidade nota-se, em mim, apenas, na necessidade de me descobrir e desestabilizar a ideia intrínseca de ser um e trabalhar outro, de forma a, sim, resistir ao meio envolvente e deixar-me ser paisagem.
7 – Endereço na web/blogosfera para o podermos seguir?
Blogue Serenismo (http://serenismo.blogspot.com), projecto Alma Tua (www.almatua.com) e/ou Facebook (https://www.facebook.com/zmiguelgomes).
Tenho vaidade que sejas da minha e que faças parte da minha . És um ser maravilhoso feito de Natureza e Poesia
Obrigado Miguel por seres como és … beijinhos especiais da avó Leta