A RUA da Estrada de Arbo é um desfile do mais puro radicalismo galego. Chamaram-lhe “feísmo” as almas estetas que passam a vida a moer mágoas e a verter fel sobre a perda de um passado mítico que só vive na lírica de Rosalia de Castro ou nas febres nacionalistas dos que viam na galiza um paraíso celta rico, próspero, uma terra farturenta a tocar gaita. Não era. Era terra de labregos pobres emigrando, até nos campos só ficarem toupeiras e morcegos e quase não haver gente que os espantasse.
Do osso da terra escassa, das entranhas da terra galega, ressuscitou o granito do Porriño que tudo dá, desde brita de vários calibres, a pedregulhos ciclópicos e peças de Lego de que se fazem casas, muros, escadas, varandas, balaustradas e tudo e tudo. Tecnológico, polido, tosco, picado, torneado… combina-se depois este pré-fabricado de milhares de feitios, com outros tantos materiais, formas e modos de construir que produzem variedade e feitio até ao infinito.
No final, coloca-se uma paragem de autobus em transparente, vidro e ondulado branco a condizer e está o cenário composto. Prados, rios, arboredas, / Pinares que move ó vento, / Paxariños piadores, / Casiña dó meu contento (…) cantava Rosalia quando aqui se sentava à espera do futuro.
Álvaro Domingues (Melgaço, 1959) é geógrafo e professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, onde também é investigador no CEAU-Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo. É autor de A Rua da Estrada, Vida no Campo e Volta a Portugal. Colabora com o Correio do Porto desde janeiro de 2015.
Publicado originalmente em 16 de Agosto de 2015