PAULO Stocker, ou melhor, Clovis Paulo Stocker além de artista plástico, cartunista, muralista (diferente de moralista) e ilustrador é também cidadão, catarinense, paulista, pai, marido, ciclista e canceriano. Em resumo: é um cidadão e artista interventivo, tendo sido politicamente incorreto antes de tempo. O nascimento da filha Teodora foi o momento inspirador (como se fosse uma luz) da criação do personagem homónimo Clovis: uma silhueta cujo original não tem cor (pode ser negro, branco, etc…). No fundo, no fundo é um artista que desenha para resistir.

Por Paulo Moreira Lopes

Você prefere chamar-se Paulo ou Clovis?

Tanto Faz. Pode ser Paulo.

Os seus pais quando se zangavam chamavam-lhe Clóvis Paulo?

Minha mãe me chamava de Clovinhos, o que me torturou até os 15 anos. Quando estava zangada tirava o “”inho”.

O seu pai tinha dor de cotovelo do amor que a sua mãe lhe dava?

Ele fugiu de casa por apanhar de sua mãe, dizia que tinha inveja do carinho que a gente recebia da nossa.

Se não fosse quadrinista seria o quê?

Nada.

Não ficava com as mãos gordurosas no tempo em que ia ao sebo descobrir os quadrinhos independentes e as edições europeias de segunda mão?

Sim, era chamado pelos desafetos de rato de sebo.

Considera-se retardado por chegar atrasado aos objetivos que fixa na vida?

Não, eu pago o preço.

Depois do café torrado qual a coisa mais alucinogénia que experimentou?

Ser pai.

Os projetos que fez em Santa Catarina eram sistematicamente desfeitos porque entrava sempre com os dois pés?

Sim. E chutava as portas naquela época. Hoje já não me interessa abri-las. Nossa época será conhecida como a era da mediocridade.

Se navega sobre as águas do cartoon europeu é frequente ficar sem pé?

Mergulho.

Afirma que é uma criança que nunca parou de desenhar. Quer dizer que é uma pessoa para não levar a sério?

Brinco de ser sério, levo a sério a brincadeira.

Enquanto foi mastigando os artistas que admirava nunca se engasgou?

Nunca, mastigava bem mastigado.

Quem nasceu primeiro: o quadrinho (do Paulo) ou o Clóvis?

Primeiro o do Paulo.

Se o Clóvis é uma sombra, como será o original?

Essa é a ideia, ele não tem cor. Pode ser negro, branco, etc…

Criou o Clóvis para compensar o seu falhanço como clow?

Nada, se eu tivesse investido na carreira de Clow eu teria sucesso.

O Clóvis só usa bike por ser um chapa ou por ter chumbado na escola de condução?

Meu pai era motorista, um herói, salvou vidas… Como jamais me igualaria a ele, optei pela bike.

Com tanto Clóvis na rua não tem medo que estes, um dia, se revoltem e matem o seu criador?

Não, seria suicídio.

Na rua Augusta botou adesivos do Clóvis em todos os lugares. Fez isso por que a rua tinha muitas feridas?

Um tigre marca seu território.

Diz que ter-se um filho é um negócio muito forte, muito bonito. E dá lucro?

Se você considera amor parte desse lucro, eu tô na FORBES.

Quando sua mulher briga consigo e não responde e, para cúmulo, ainda obedece como todo o bom homem faz, não acha que está a ser mau para ela?

Sim, é minha vingança.

Em vez de pôr a Teodora a vigiar a polícia enquanto cola os cartazes, não seria preferível pedir ao Clóvis para dar uma olhada nas redondezas?

A Teodora é mais eficiente.

Não tem inveja do Clóvis por ter viajado mais que você (até já foi à Birmânia)?

Tenho.

Quando você fica atrapalhado o traço sai torto (em caso afirmativo: pior para o Clóvis)?

Não, desenho de olhos fechados. Tenho domínio da técnica. Fora isso, sou louco, com todos os direitos para o Fernando Pessoa.

Se o nascimento da Teodora inspirou a criação do Clóvis, não pensa ter outro filho para criar o Paulo?

Clovis vai adotar um filho.

É possível driblar panelas sem se aleijar ou ser aleijado?

Não. As panelas fazem parte da era da mediocridade.

Põe a máscara feia de carrancudo para o levarem a sério?

Para proteger esse cara que assina papéis em branco.

Diz que desenha praticamente 24 horas por dia. Quando não tem papel desenha aonde?

Na mente.

Se fazer música é o exercício do silêncio, desenhar é o quê?

O exercício do vazio. Sem vazio não tem composição, vira arte de rua.

Prefere ser quadrinista ou clovinista?

Clovinista.

Pode ordenar, por ordem crescente de importância, as características/funções que lhe estão associadas: cidadão, catarinense, paulista, pai, marido, ciclista, artista plástico, cartunista, muralista, ilustrador, canceriano (até pode acrescentar outras)?

Assim tá bom.

Você não usa texto porque não sabe escrever ou é por preguiça?

Um ex-amigo me dizia que desenho por não saber escrever. Ele tá certo.

Podemos dizer que você é um pantomineiro como Fernando Pessoa (o poeta é um fingidor)?

Exatamente.

Você desenha para existir ou existe para desenhar?

Para resistir.

Será que o Eduardo Rodrigues ficou com a mente pervertida por conviver consigo (diz-me com quem andas que eu dir-te-ei quem és)?

Foi o contrário. Ele me desencaminhou.

Agora que é moda ser politicamente incorreto vai passar a ser politicamente correto só para contrariar?

Não me baseio em modas. Elas passam, eu passarei…

Será que um dia poderá vender seus sonhos ao dono do supermercado?

Não sei. Só sei sonhar.

Ainda acha que no geral as pessoas emburreceram?

Creio que a burrice ficou mais exposta. Se você ler “pequeno hombrezito” de Wilhian Reich, vai entender.

No fundo, no fundo, você é um cara legal?

Meio legal e meio chato. Como qualquer pessoa.

§

Ver ainda sobre o autor Efeitos especiais de João Manuel Ribeiro e Paulo Stocker

Publicado originalmente em 25 de Agosto de 2015

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