DAS mil vezes que fui com o meu pai às pesqueiras do Novo da Volta armar e desarmar à lampreia, ao sável e ao salmão (e a outros indesejáveis escamosos, desde que não fossem trutas), não me lembro de ter encontrado o rio Minho tão seco. É o que acontece aos rios quando saem do leito e se metem pela Rua da Estrada para curso alternativo.
Ou então, não. É uma réplica de uma pesqueira com seu número de registo e com a rede armada, a decorar uma rotunda na auto-denominada terra da lampreia que é a vizinha vila de Arbo por onde a Rua da Estrada também passa. A única contradição é que os muros e as pesqueiras dificultavam o curso da corrente para o peixe entrar pela boca da pesqueira e enfiar-se na rede. Aqui não: o animal é obrigado a contornar a pesqueira, como reza nas tabuletas. Se o rio tivesse esta sinalética e as lampreias a entendessem, era um desgosto para o arroz.
Não sei que mais vos dizer. “Armar a pesqueira” era uma expressão que o meu pai usava para se referir a qualquer negócio montado no lugar certo, ou truque baixo para sacar dinheiro, assim como o Estado ao contribuinte a propósito de tudo, incluindo redes e pesqueiras e exceptuando certas enguias muito treinadas em manobras de fuga ao fisco.
Álvaro Domingues (Melgaço, 1959) é geógrafo e professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, onde também é investigador no CEAU-Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo. É autor de A Rua da Estrada, Vida no Campo e Volta a Portugal. Colabora com o Correio do Porto desde janeiro de 2015.
Publicado originalmente em 25 de Agosto de 2015