[H]Á que tempos que olho para isto sem lhe apanhar umas parábolas. As parábolas, ao que dizem, são narrativas curtas que abrem caminho para outras vastidões. Estão os caminhos bem abertos mas é aquele anúncio amarelo que nos tolhe: o risco de esperas prolongadas desmotiva qualquer um e é assim que a apatia nos acerta na base da nuca.
Arturo Soria y Mata foi o madrileno que inventou uma Ciudad Lineal, uma espécie de utopia de fim de século (1886) para resolver de vez e em grande estilo as ineficácias da urbanização, os negócios do solo e do imobiliário, a incapacidade de resposta das soluções funcionais e infraestruturais e por aí[1]. Toda a artilharia tecnológica do século dos prodígios das comunicações e dos transportes – ferrovia, tranvias, rede telefónica, eléctrica… -, seria mobilizada para tal empreendimento. À época, o pensamento de Soria y Mata era bastante influenciado por ventos da América e por autores tão importantes como Frederick Olmsted, o celebrado arquitecto paisagista do Central Park de Nova York em busca de uma solução para as congestões metropolitanas dos EUA.
Com a Ciudad Lineal lá se ia a mitologia europeia da cidade eterna, da dicotomia rural/urbano, da aglomeração, da proximidade física, da densidade, da forma…, e até os pobres teriam direito a um lote de 400 metros quadrados para cultivar e ter uma casa nas tiras laterais de 1300 metros cada que iriam acompanhar a espinha central das infraestruturas que asseguraria a mobilidade a todos para tudo, fosse gente, mercadorias, energia ou informação. Esta tira sociotécnica, funcional, política e o que mais se quiser que caiba nos sentidos infinitos da cidade e do urbano, podia ir de Madrid a Moscovo. No mapa, a cidade seria uma linha.
Começou-se a instalar a linha infraestrutural que iria agarrar as tiras laterais da Ciudad Lineal mas, devido à espera prolongada, o plano falhou. É o que acontece quase sempre ao planeamento urbanístico, apesar de se acreditar que não. Em todo o caso, desde Junho de 2015 está criada a Infraestruturas de Portugal, IP, que junta as estradas e o caminho-de-ferro para facilitar estas manobras. Este é o primeiro projecto realizado pela parelha. Está catita! Tem um ar fashion retro como convém às tendências da moda. Em caso de falta de combustível, já pode por o carro em cima dos carris com os airbags insuflados e esperar pelo Alfa que lhe transmitirá as devidas sinergias: para onde quer que vá, nós estamos lá, diz a campanha da apresentação da marca IP.
Por Álvaro Domingues autor de A Rua da Estrada.
[1] Ver, a propósito, Carlos SAMBRICIO (1982), “Arturo Soria Y la Ciudad Lineal”, Quadernos del Consejo Superior de los Colegios de Arquitectos, nº58, pp.22-30,http://oa.upm.es/10922/1/arturosoriaylaciudadlineal.pdf