QUASE todas as crianças já disseram querer ser astronauta quando forem grandes. Rui Marques Moura, professor da Faculdade de Ciências da U.Porto (FCUP), será dos poucos no mundo que está perto de concretizar esse sonho de criança.
O engenheiro geólogo, docente Departamento de Geociências, Ambiente e Ordenamento do Território da FCUP e piloto de aviões no tempo livre, é um dos primeiros portugueses escolhidos parafrequentar o curso de qualificação do projeto POSSUM (Polar Suborbital Science in the Upper Mesosphere), um programa comercial desenvolvido com o apoio da NASA, que tem por objetivo levar cientistas ao limite do espaço para estudar a mesosfera.
O obrigatório curso de preparação de seis semanas nos EUA incluiu uma formação teórica centrada em temas como a geofísica da atmosfera e a fisiologia de voo espacial e uma formação prática que passou por uma simulação completa de uma missão científica, com e sem fato espacial, e treinos de habituação às forças G em aviões de acrobacia aérea.
Tudo isto para que Rui Marques Moura se aproxime do objetivo de ser o primeiro português a atingir as “portas do espaço” e assim cumprir o sonho antigo alimentado pelas séries televisivas de Carl Sagan, pelos filmes de Stanley Kubrick ou pela música de David Bowie.
Naturalidade? Vimeiro, Santa Comba Dão.
Idade? 48 anos.
– De que mais gosta na Universidade do Porto?
Do seu passado, do seu futuro e, claro está, das pessoas com quem trabalho.
– De que menos gosta na Universidade do Porto?
Da redundância burocrática de muitas tarefas administrativas que fazemos. Sou a favor de um principio por vezes evocado na industria da aviação, o KISS – Keep It Simple Stupid -, “instituído” engenheiro Kelly Johnson, da empresa norte-americana Lockheed Martin.
– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?
O Espaço é um excelente mote para cativar as pessoas para o estudo e para a investigação. Por isso promoveria uma acção de divulgação daquilo que a Universidade já faz e pode vir a fazer no campo da Terra e do Espaço e onde todas as faculdades fossem convidadas a participar. Para além das suas áreas tradicionais , tais como as ciências e as engenharias, o Espaço é um tema onde outras áreas, tais como a medicina, a engenharia agro-alimentar, as ciências do deporto, a ergonomia e a motricidade humana, a psicologia e – porque não? – as artes e a literatura também devem ter um papel. Recentemente comprei um livro magnífico sobre a obra de Galina Balashova, uma arquitecta que participou no design do interior das cápsulas e das estações espaciais Soviéticas, que demonstra este princípio.
– Como prefere passar os tempos livres?
Gosto de estudar outros temas fora da minha especialidade em Geofísica. Tive um professor no ensino secundário, um antigo major do exército, que me dizia que variar de tema era um dos melhores descansos. Por outro lado, quando posso, gosto muito de voar e fazer a manutenção de um pequeno avião que tenho. Mas também gosto de correr, ler e acima de tudo estar na companhia da minha família.
– Um livro preferido?
Alusivo ao tema do Espaço, sugeria o Moonfire do Norman Mailer. De uma forma mais geral, ocorre-me O Memorial do Convento, de Saramago, O Fio da Navalha, de Somerset Maugham, assim como muitos dos contos do Anton Tchekov.
– Um disco/músico preferido?
Sempre tive um gosto muito ecléctico. O Espaço rende-se bem a David Bowie e à musica electrónica, por isso sugeria o álbum homónimo de David Bowie de 1969 ou o Moon Safari dos Air. Ou algo nacional como o tema Sunflare dos Moullinex ou a Pedra Filosofalcantada por Manuel Freire. Além do mais, este último tema tem por base o belíssimo poema de António Gedeão, o pseudónimo adoptado por Rómulo de Carvalho, um ilustre poeta e professor de física e química.
– Um prato preferido?
Filetes de Polvo com arroz do mesmo.
– Um filme preferido?
O 2001 Odisseia no Espaço de Stanley Kubrick. Uma obra prima do cinema, pela estética, pela visão futurista e também pelo rigor que colocou na forma de retratar a exploração do espaço.
– Uma viagem de sonho?
Para além da viagem espacial, seria voar do Porto ao Pólo Norte. Com os pés mais assentes em terra e influenciado pelo Jack Kerouac, gostava de atravessar os EUA de costa a costa, embora já tenha feito parte dessa viagem, desde Santa Fe, no Novo México, a Las Vegas, no estado de Nevada.
– Um objetivo na vida?
Ser feliz, ser um bom pai e um bom ser humano.
– Uma inspiração?
Em termos de personalidade e ambição sem dúvida que foram os meu pais. Difícil escolher uma pessoa, sou constantemente inspirado e sou uma amalgama de muitas. Hoje inspiram-me a minha filha, a minha mulher, o meu irmão e a enorme bondade e paciência do meu tio. Se formos para o plano dos astro-cosmonautas então há apenas cerca de 560 por onde escolher. Diria, talvez Yuri Gagarin, Valentina Tereshkova, Scott Carpenter, Buzz Aldrin, John Young, Harrisson Schmidt, Eileen Collins, Sergei Krikalev, Claude Nicolier, Chris Hadfield, Alexander Gerst, Nicole Stott e Don Pettit. Em termos de temáticas do espaço a minha infância foi também influenciada por pessoas como Patrick Moore, Eurico da Fonseca, Carl Sagan e a sua série televisiva, “O Cosmos”, a qual vi em criança, em 1980, quando ainda vivia em Londres. No que toca à aviação, e mais próximo de casa, inspiraram-me a nossa excelente Força Aérea e os meus excelentes instrutores de voo.
– O projeto da sua vida…
Eventualmente poder vir a representar a minha Universidade e o meu país numa missão espacial tripulada, obviamente dotada de objectivos científicos. Ou seja, sem que essa viagem apenas fosse por uma qualquer vã glória de lá chegar.
– Uma pessoa / objeto que levaria consigo para o espaço?
Em abstracto levaria a minha filha e em concreto a fotografia dos meus pais e da minha família. No entanto se quisesse levar esta questão ainda mais para o plano dos princípios e pudesse levar muito mais pessoas então levaria os estudantes. O futuro é deles e são eles que me inspiram a inspirar.
Por Tiago Reis publicado in http://noticias.up.pt/