SER pai, hoje sei, é tornar-se um feliz prisioneiro. Exceto por um passeio pelas redondezas (e muitas vezes apenas para ir ao supermercado), meus fins de semana têm sido completamente em casa, ao lado de minha amada e dedicada esposa, cuidando de nosso rebento ― não, no Japão não é comum a existência de babás e/ou empregados domésticos… De modo que são os pais que, embora trabalhando, fazem das tripas coração para que a criança tenha a atenção necessária.
Mas prosseguindo: assim como ficou difícil para sairmos de casa; receber visitas tornou-se igualmente complicado. O que, vale frisar, não é um grande problema para os japoneses, que, por sua natureza discreta, não costumam visitar uns aos outros. Uma característica que, aliás, combina perfeitamente com o meu modo arredio de ser. Sou brasileiro, sim, e tenho saudades de meu país; mas confesso que uma das coisas que mais me chateavam quando eu lá residia era o de ter sempre um vizinho ou “conhecido” batendo à porta. Sei que muitos dirão que devo respeitar as peculiaridades de cada povo, que isso faz parte do caráter amigável do brasileiro e blá-blá-blá… Mas, à noite, cansado, tudo o que eu pedia a meus “amigáveis vizinhos” era que me deixassem descansar. No Japão, felizmente, tal problema terminou ― e com um bônus: o de manter a casa limpa graças ao maravilhoso costume nipônico de retirar-se os sapatos na entrada das residências. E esse hábito é tão valorizado que sequer se faz necessário alertar os visitantes: os quais já chegam com consciência de que adentrar com sapatos uma casa é, sobretudo, uma ato de desrespeito em relação a seus habitantes.
E, onde quer que morem, os japoneses fazem questão de manter esse costume salutar. Recordo que, quando passamos uma temporada no Brasil em 2010, minha esposa colocou um tapete na entrada como se fosse uma linha demarcadora: e, toda vez que recebíamos uma visita, pedíamos imediatamente que esta retirasse os sapatos antes do referido tapete. A maioria dos visitantes, justiça seja feita, respeitaram as regras de nosso lar. Mas houve um tipo que, além de ignorar o pedido, ainda teve a péssima educação de dizer-nos: “Ah, desculpe, mas não estamos no Japão!”. Juro que, naquele momento, contive-me para não lhe dar uma chinelada!
Depois, fiquei me perguntando o que leva um indivíduo a comportar-se de modo tão arrogante e mal-educado. São pessoas, presumo, que não possuem bons modos onde quer que adentrem: seja uma casa, um bar ou mesmo um país. E, quando recebem a porta na cara, ficam bancando as vítimas: caso, por exemplo, dos imigrantes que preferem falar mal do país do que adaptar-se às regras locais ― sujando, enfim, a casa alheia com os sapatos da irresponsabilidade…
EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus (Amazonas-Brasil) em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta” (2015), “Trovas escritas no tronco de um bambu” (2018) e, mais recentemente, pela editora alemã JustFiction! Edition: GOTAS FRIAS DE SUOR (Microcontos góticos, 2018):
https://www.morebooks.shop/store/gb/book/gotas-frias-de-suor/isbn/978-613-7-39949-1
Página para contato com o autor: https://www.facebook.com/edweine.loureiro
Cada povo com seu costume. Correto até se pedir que se tire os sapatos se a pessoa que visita pela primeira vez desconhece o costume.
Aqui qdo estou com a faxineira que vem de longe me ajudar, coloco um pano perto da porta e se chega alguém já digo para limpar os pés. Se quero ir da cozinha para o quarto enquanto ela está limpando, tiro os chinelos.
Seria um dos costumes que o brasileiro poderia imitar.
Realmente. Tirar os sapatos quando se adentra uma casa é sinal de grande respeito pois carregamos em suas solas um mundo de imundícia. Que bom mesmo se os brasileiros adotassem esse costume salutar
Obrigado, queridas amigas Maura e Marilene, pela carinhosa leitura. Abraços poéticos!