UMA das boas memórias dos tempos de infância são os fins de semana na casa de meus avós maternos, onde eu deliciava-me com os pratos portugueses que vovó preparava. E essa reminiscência é tão forte que, aonde quer que eu vá, não resisto adentrar se vejo um restaurante e bar tipicamente lusitanos.
E, na mais recente viagem que fiz a Quioto, tive a sorte de encontrar o único estabelecimento português existente na cidade: o “Castella do Paulo”. Como o próprio título já anuncia, trata-se de uma casa especializada principalmente no delicioso bolo castella: um pão de ló trazido ao Japão, mais precisamente a Nagasaki, por mercadores e missionários portugueses, ainda no século XVI.
Mas, para além do referido bolo, o restaurante também serve todos os pratos típicos da terra de Camões (incluindo, claro, os irresistíveis bolinhos de bacalhau). E vinhos, naturalmente. Aliás, foi o proprietário da casa, o simpático Paulo Duarte, quem recomendou a este atrapalhado brasileiro qual vinho casava melhor com o prato do dia: ocasião em que aproveitei para um rápido bate-papo, descobrindo, assim, mais a respeito da história daquele maravilhoso lugar.
Paulo e sua esposa, a alegre Sra. Tomoko, tiveram, primeiramente, um restaurante em Portugal, especializado na culinária da Terra do Sol Nascente. Com o filho já adulto, o casal, então, decidiu tomar novos ares; vindo para o Japão: primeiro, a Nagasaki, a fim de aprimorar a técnica da feitura do bolo castella; e, em seguida, a Quioto, terra natal da esposa. E foi assim que nasceu, há cinco anos, o “Castella do Paulo”, um sucesso absoluto que despertou a atenção até da tevê japonesa: que, em janeiro de 2019, fez um programa especial a respeito do estabelecimento.
E esse sucesso é comprovado por todos que lá visitam. No dia em que fomos, tivemos mesmo dificuldade de encontrar uma mesa desocupada; em virtude do grande número de clientes: não só japoneses como também um grupo de turistas portugueses a matar as saudades da terrinha. Aliás, falando em saudades, indaguei a Paulo se ele já se acostumara à vida no Japão, ou se havia algo, principalmente em relação à clientela, que ainda lhe parecia estranho. Foi então que ele respondeu-me: “Só tenho a dizer coisas positivas sobre os clientes japoneses: um povo, sobretudo, honesto. Talvez a única dificuldade seja a falta do que chamamos, em Portugal, de “economia eletrônica”, uma vez que os japoneses não costumam usar cartões de crédito. Também estranho um pouco que não se tenha, na cultura japonesa, o gosto pela competitividade, tão necessária no mundo de hoje”. ― E, em seguida, olhando para o meu bebê, que ressonava no carrinho, Paulo completou bem-humorado: “Estás a escutar, ó miúdo?”.
EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus (Amazonas-Brasil) em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta” (2015), “Trovas escritas no tronco de um bambu” (2018) e, mais recentemente, pela editora alemã JustFiction! Edition: GOTAS FRIAS DE SUOR (Microcontos góticos, 2018). Página para contato com o autor: https://www.facebook.com/edweine.loureiro