EM japonês, o termo Pawahara é uma adaptação do inglês Power Harassment. Trocando em miúdos, seria a relação de poder exercida por uma autoridade de forma abusiva: por exemplo, o chefe que faz uso da intimidação ― como a ameaça de demissão ― para forçar o empregado a realizar determinados atos. No Japão, é verdade, a dispensa é menos utilizada do que a tática de relegar o funcionário ao isolamento. O que também não deixa de ser um abuso de poder, visto que gera o constrangimento do empregado perante os seus colegas. Pois bem: seja qual for o método utilizado, o fato é que, na Terra do Sol Nascente, o pawahara tem sido, sim, um gravíssimo problema. Isso porque, em virtude do excessivo respeito à hierarquia, muitos japoneses acabam sofrendo calados tais abusos: o que os leva à depressão e, infelizmente, até mesmo ao suicídio.
Trata-se, portanto, de um tipo de subserviência extremamente perigosa; pois é amparada na crença de que os que estão no topo (chefes e/ou mais velhos) têm o direito de fazer o que bem entenderem com os subalternos. Uma crença que, aliás, já vem desde os tempos de escola. Foi o que testemunhei quando trabalhava como assistente de Inglês em um colégio local: professores e estudantes mais antigos gritando e pressionando os novos alunos contra a parede, como se fosse a coisa mais normal do mundo.
Ao que parece, não satisfeitos com as pressões psicológicas do período escolar, muitos chefes japoneses trazem o mesmo (mau) hábito de seus professores para dentro das empresas. Assim, no primeiro erro do trabalhador, o estressado mandachuva dispara gritos e ofensas, enquanto o alvo da ira permanence cabisbaixo, sob os olhares dos colegas. Após isso, naturalmente, o trabalhador, humilhado, acaba caindo em depressão. E, aí, como mencionei acima, as consequências podem ser fatais.
Infelizmente, a lei japonesa parece ignorar um assunto tão grave. Mas isso não significa que não haja uma luz no fim do túnel para o trabalhador. Há. Por exemplo, certa vez, li uma entrevista de um advogado especializado nessa questão, o Dr. Naoto Akiyama, em que o mesmo falava que, sim, é possível a ação judicial contra casos de constrangimento no ambiente laboral. E, para amparar sua tese, o nobre causídico mencionava as leis japonesas que tratam da segurança no trabalho ― caso do Industrial Safety and Health Act, de 1972 ―, como base legal aproximada para a ação. O único problema desse argumento, a meu ver, é que as leis referem-se mais à proteção do trabalhador em ambientes insalubres e perigosos; o que demandaria, portanto, uma grande vontade por parte do tribunal de relacionar tais normas à questão do constrangimento.
Enquanto isso, na prática, os chefes vão destruindo, de modo impune, a autoestima dos trabalhadores… Até quando? Deixo aqui a pergunta… e o meu grito.
EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus (Amazonas-Brasil) em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta” (2015), “Trovas escritas no tronco de um bambu” (2018) e “Gotas frias de suor” (2018). É também colunista do JORNAL EM DIA, no Brasil:
http://www.jornalemdia.com.br/categorias.php?p=16172
Uma sociedade tão tecnológicamente desenvolvida como a japonesa, carrega dentro de si a rudeza de costumes arcaicos e rudimentares.
É, amigo Salim… Há muitas coisas boas no desenvolvimento, mas nem tudo é paraíso. Não há paraísos onde o ser humano pisa. Abraços e obrigado pela leitura.
Ótimo texto. A solução de um problema começa a ser alcançado quando se fala a respeito dele. Mostra que além de estarmos procurando uma resposta adequada, também somos solidários
com os que passam por ele. Parabéns Edweine!
Obrigado, querida amiga Vera, pelos dizeres e pela carinhosa leitura.