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Na Água do Tempo de Luísa Dacosta

Na Água do Tempo de Luísa Dacosta

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TERMINEI a leitura do livro “Na Água do Tempo”, de Luísa Dacosta. Trata-se de um Diário que guarda grande riqueza da memória do tempo, de registo verdadeiramente inspirador.

Dacosta busca o fundo da alma e o fundo dos dias – trabalha-os numa renda visual genuína, numa linguagem ao rés do coloquial. Viaja-se com ela pelas cidades portuguesas e pelo campo, pelo mundo terreno e o mundo espiritual.

Os relatos começam em 1948 e vão até 1987 – são, portanto, quase 40 anos; 39 anos em que Dacosta manteve um diário, e iniciou-o com apenas 21 anos Grande génio da escrita se me revelou Luísa Dacosta! , de quem apenas conhecia o livro infanto-juvenil “História com Recadinho”. Depois desta leitura, vou procurar mais livros dela.

O estilo é apurado, intenso e fica a ecoar palavras, pensamentos, emoções, sensações… tempos e tempos após a leitura. A vida em plenitude, de expressão cósmica e paixão, enamoramento das coisas simples, na sua predisposição amorosa para o diverso, apagando a força da iminente premonição do abismo que é a vida:

“Acordei a tempo de ver o espreguiçar estremunhado da terra.”;

“Qualquer coisa há na paisagem de adormecido, de sonho, que a serra vigia, atenta como o velho dragão desconfiado”;

“A paisagem movente, ensolarada, azul, luminosa e marinha é aquela que eu tinha decidido seria para sempre como entrar na infância no sonho. Mas não tenho nenhum sonho para habitar a paisagem que se fere de insídias, de abandono, se lacera de ausência. Como foi possível? Não há só destinos. Há maus fados. Só nas histórias antigas é que tudo era de sempre e para sempre, porque o tempo não existe, é auroral, eterno e sem desgaste”.

Dacosta, Luísa, in ‘Na Água do Tempo” (diário), Ed. Quimera, 1992.

Por Anabela Borges, 29/02/2020, publicado in Facebook

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