O “ESTADO de Emergência” terminou oficialmente no Japão no dia trinta e um de maio. Claro que ninguém avisou isso ao vírus. Mas o fato é que, mesmo em abril, quando o número de contagiados em Tóquio estava crescendo de um modo preocupante, jamais tivemos de passar pela experiência da “quarentena” como em outros países. Isso porque não havia nem há medidas legais que obriguem o povo japonês a adotar o confinamento ― lembro-me até de ter comentado, em crônicas anteriores, que eu achava um risco não existirem tais medidas. No entanto, para a minha surpresa, a situação no Japão não se tornou apocalíptica: como, lamentavelmente, ocorreu nos Estados Unidos e no Brasil. E por quê? Bem, a única explicação plausível que encontro para o relativo controle da doença na Terra do Sol Nascente é o fator cultural: pois os japoneses, mesmo não sendo obrigados a praticar uma determinada ação, costumam “seguir a coletividade”. E foi isso que, a meu ver, aconteceu: como o Governo recomendara que evitassem sair de casa, a grande maioria dos japoneses decidiu respeitar. E, como consequência dessa conscientização coletiva, hoje os casos de COVID-19 já não são tão alarmantes como pareciam em abril.

De modo que, em junho, começou gradativamente a reabertura das atividades no Japão; obviamente, vale frisar, com as devidas medidas de proteção: por exemplo, com o funcionamento de empresas e escolas em apenas alguns dias na semana, e isso com a rotatividade de alunos e empregados (hoje, grupo “A”, amanhã “B”, e assim por diante). Além de, claro, máscaras e álcool gel… sempre ― como não poderia ser diferente. Eu mesmo só consegui reiniciar meu trabalho como professor, no último dia seis, graças às devidas precauções: dando aulas com máscara, além de ficar separado dos alunos através de uma “proteção de vidro”.

Acredito, pois, que, com todos esses cuidados, haverá progresso na retomada das atividades no Japão. Até quando não sei; pois, afinal de contas, o inimigo é invisível e perigoso. Mas acho que, dentro dos limites humanos, o Japão está fazendo a sua parte. Até mesmo nos metrôs, que, na hora do rush, costumavam ser verdadeiras “latas de sardinha”, começamos a ver agora um certo controle: isso porque, ainda que não haja demarcação alguma nas poltronas, as pessoas sentam-se procurando respeitar o distanciamento social. O que é excelente.

Só uma coisa me preocupa: cresce o número de pessoas falando sozinhas nos transportes coletivos. Hoje mesmo vi um senhor que ficava olhando cada passageiro e gritando “yabai” (que pode ser traduzido tanto como “legal” quanto como “perigoso”). Mas acho que, no fim das contas, sejam até naturais esses casos de “loucura”, considerando-se tudo isso que o mundo tem testemunhado em 2020. E mais: que, na verdade, esses que parecem ter perdido o senso nem sejam tão loucos assim. Mais loucos, eu diria, são aqueles que, vendo tudo o que está ocorrendo ao redor, nada sintam ― e até minimizem a dor alheia. De tais loucos, sim, eu quero distanciamento social… e perpétuo.

EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus (Amazonas-Brasil) em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta” (2015), “Trovas escritas no tronco de um bambu” (2018), “Gotas frias de suor” (2018) e “Centelhas” (romance, 2019).  Foi o vencedor do 13º Concurso de Microcontos do Festival de Cine TerrorMolins (Espanha, 2019). É também colunista do JORNAL EM DIA, no Brasil: http://www.jornalemdia.com.br/categorias.php?p=16172

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