O APELO de Bolsonaro ao “retorno à normalidade” no momento em que os casos de Covid 19 disparavam no Brasil, deixa uma pergunta no ar: quais serão no final das contas, os efeitos da pandemia no seu governo?

Nas redes sociais, as suas declarações sobre o novo vírus viraram anedota pública, e o twitter chegou a tomar a decisão inédita de bloquear vídeos publicados por um Presidente da República. No Congresso, perdeu base política na confrontação com Governadores e segmentos mais conservadores. Mas para a ala neoliberal do seu governo, a agudização da crise pode ser vista como uma oportunidade.

Aos milhões de brasileiros que vivem em condições sanitárias de vulnerabilidade extrema, Bolsonaro respondeu que “brasileiro pula em esgoto e não acontece nada”. Com a mesma negligência, o Presidente negou a necessidade de encerrar escolas, autorizou atividades religiosas e lotéricas durante a quarentena, e chegou a encomendar uma campanha publicitária com o slogan “o Brasil não pode parar”.

Para o político que louva a memória de torturadores em plena assembleia nacional, o sofrimento de centenas de milhares de brasileiros não passa de um mal menor face aos imperativos económicos que representa. Afinal quem vai pagar a fatura mais alta, são tudo o que a extrema direita não precisa: velhos, pobres, presos e índios.

Mais importante para o executivo deste governo, a pandemia pode gerar o contexto ideal para a imposição da sua agenda de privações, flexibilização de leis laborais e liberalização do garimpo em terras indígenas, entre outras atividades e medidas “urgentes” para alavancar os meios financeiros da terapia de choque¹ que se segue.

Que a desordem e instabilidade sistémica constituíram a base material do projeto de poder de Bolsonaro já tinha sido aqui escrito. Agora, o Estado de Calamidade Pública que se anuncia pode ser a carta branca que o seu “Posto Ipiranga” precisa para vender o que resta do Brasil.

Texto de José Barbedo e ilustração de Dacosta

¹ Klein, Naomi. 2007  The Shock Doctrine: The Rise of Disaster Capitalism. Knopf Canada, Toronto.

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