O ESCRITOR Vasco Graça Moura, de 72 anos, faleceu, este domingo de manhã, no Hospital da Luz, em Lisboa. O corpo vai estar em câmara ardente, a partir das 19.00 horas, na Basílica da Estrela. Segundo fonte do Centro Cultural de Belém (CCB), o escritor, que era presidente da Fundação CCB desde janeiro de 2012, faleceu de doença prolongada cerca das 12.00 horas, no Hospital da Luz, em Lisboa.
Na segunda-feira, pelas 21.00 horas, terá lugar uma cerimónia de homenagem ao escritor e poeta na Basílica da Estrela, onde serão tocados suites para violoncelo de Bach, havendo ainda lugar a um “apontamento de fado”, segundo informações prestadas pela assessoria de imprensa do Centro Cultural de Belém (CCB).
O funeral realiza-se na terça-feira. As cerimónias religiosas estão marcadas para as 10.00 horas, iniciando-se com uma missa presidida pelo padre Tolentino de Mendonça, seguindo depois o corpo para o cemitério dos Olivais, onde será cremado.
As cinzas seguem depois para o Porto, de onde Graça Moura era natural.
Romancista, poeta, ensaísta, tradutor, ex-deputado e ex-secretário de Estado, Vasco Graça Moura celebrou no ano passado 50 anos de vida literária e foi alvo de várias homenagens este ano, nomeadamente pela Fundação Gulbenkian. Em janeiro, foi condecorado com a Grã-Cruz da Ordem de Santiago de Espada. Na altura, Vasco Graça Moura, sem qualquer hesitação, afirmou: “A poesia é a minha forma verbal de estar no mundo”.
Vasco Graça Moura nasceu no Porto, na Foz do Douro, em 1942, licenciou-se em Direito, pela Universidade de Lisboa, e chegou a exercer a advocacia, de 1966 a 1983, até a carreira literária se estabelecer em pleno.
Na altura, apenas a poesia definia a sua expressão, com títulos como “Modo mudando”, estreia nas Letras, em 1962, a que se seguiram títulos como “Semana inglesa” e “O mês de dezembro”. Mas Vasco Graça Moura era também o jurista, o gestor e o político.
Em 1974, após o 25 de Abril, aderiu ao Partido Popular Democrático, atual PSD, tendo assumido a secretaria de Estado da Segurança Social do IV Governo Provisório, liderado por Vasco Gonçalves. A experiência governativa duraria pouco mais de cinco meses, de março a agosto de 1975, e não voltaria a repeti-la.
Prosseguiu, porém, na esfera pública, num percurso que culminaria na presidência do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, iniciada em janeiro de 2012.
Antes, foi diretor da RTP (1978), administrador da Imprensa Nacional-Casa da Moeda (1979-1989), cuja política de edição literária dinamizou, foi presidente da Comissão Executiva das Comemorações do Centenário de Fernando Pessoa (1988) e da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses (1988-1995), para a qual coordenou a revista Oceanos.
Dirigiu a Fundação Casa de Mateus, foi comissário-geral de Portugal para a Exposição Universal de Sevilha (1988-1992) e diretor do Serviço de Bibliotecas e Apoio à Leitura da Fundação Calouste Gulbenkian (1996-1999).
Em 1999, passadas mais de duas décadas sobre a sua passagem por um governo provisório, o escritor regressou à política ativa, nas listas sociais-democratas ao Parlamento Europeu, tendo sido deputado até 2009, no Grupo do Partido Popular Europeu.
Em janeiro de 2012, substituiu António Mega Ferreira na presidência da Fundação Centro Cultural de Belém. Com o ex-jornalista partilhara, cerca de 20 anos antes, a ideia de candidatura de Portugal à Expo 98, num almoço junto ao Terreiro do Paço, em Lisboa.
A par dos projetos, Vasco Graça Moura nunca abandonou a escrita. Publicou, entre outros, “Instrumentos para a melancolia” (1980), “A sombra das figuras” (1985), “A furiosa paixão pelo tangível” (1987), “Uma carta no inverno” (1997), “Testamento de VGM” (2001), “Antologia dos sessenta anos” (2002) e “Os nossos tristes assuntos” (2006).
Em 2000, recolheu a poesia de “1997-2000”, a que se seguiria a “Antologia dos sessenta anos” (2002), antes do meio século de vida literária, em 2013, assinalado com a publicação, no final do ano anterior, de toda a obra poética, em dois volumes e mais de 1.200 páginas.
A obra de Vasco Graça Moura, porém, é igualmente o ensaio, o pensamento, a ligação a outras artes. Escreveu “Diálogo com (algumas) imagens” (2009), sobre protagonistas da arte portuguesa, percorreu “Circunstâncias vividas” (1995), recolheu volumes de crónicas.
O autor de “Os Lusíadas” mereceu-lhe vários volumes de ensaios, como “Luís de Camões: Alguns Desafios” (1980), “Camões e a Divina Proporção” (1985), “Sobre Camões, Gândavo e outras personagens” (2000).
Estreou-se no romance em 1987, com a evocação das “Quatro Últimas Canções”, de Richard Strauss, entre visitantes de Mateus. Regressou ao género em “O Naufrágio de Sepúlveda” (1988), “Partida de Sofonisba às seis e doze da manhã” (1993), “A morte de ninguém” (1998), “Meu amor, era de noite” (2001), “O enigma de Zulmira” (2002), “Por detrás da magnólia” (2004) e “Alfreda ou a quimera” (2008).
Traduziu peças de Racine, Molière e de Corneille, “Alguns amores de Ronsard”, “Os testamentos François Villon”, “Sonetos de Shakespeare”, “Rimas de Petrarca”, “Vida Nova” e “Divina Comédia” de Dante, clássicos a que juntou Seamus Heaney, Hans Magnus Enzensberger ou Gottfried Benn.
Recebeu o Prémio Pessoa, o Prémio Vergílio Ferreira, os prémios de Poesia do PEN Clube Português e da Associação Portuguesa de Escritores, que também lhe atribuiu o Grande Prémio de Romance e Novela, a Coroa de Ouro do Festival de Poesia de Struga, o Prémio Max Jacob de França para Poesia Estrangeira, o Prémio de Tradução do Ministério da Cultura de Itália e a Medalha de Florença, o Prémio Morgado de Mateus, para o conjunto da obra, o Prémio Europa – Cátedra David Mourão-Ferreira da Universidade de Bari, em Itália, e a Ordem de Santiago de Espada, entre outras distinções.
Manifestamente contrário ao Acordo Ortográfico, reuniu os seus argumentos sob o título “A perspectiva do desastre”, num volume publicado em 2008.
Publicado in Jornal de Notícias