AMADEU Nogueira reclama, em tribunal, vedações na Ponte do Infante, no Porto, para evitar mais quedas e suicídios. A Maldição da Ponte do Infante é uma espécie de livro que Amadeu Nogueira começou a montar, peça a peça, depois de o filho mais novo, de 23 anos, se ter supostamente atirado desta travessia que liga o Porto a Gaia, em Abril de 2004.
Inconformado com a morte de Alfredo, que não resistiu à queda nas escarpas das Fontainhas, Amadeu iniciou uma autêntica cruzada para reclamar a colocação, na ponte, de vedações de segurança com altura suficiente para desencorajar outros suicídios ou acidentes. “Nada trará o meu filho de volta. Mas podemos salvar a vida a outros”, acredita o homem que assumiu a segurança desta ponte como uma causa e está disposto a ir até ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Já organizou um abaixo-assinado. Escreveu a vários ministros, a presidentes de câmara, à protecção civil, à polícia marítima, ao bispo do Porto. Não obteve resposta. Apesar do arquivamento do caso no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP), não desistiu. Em 2007, decidiu interpor, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF), uma acção contra a Metro do Porto SA, a empresa responsável pela construção da travessia, como contrapartida da disponibilização do tabuleiro superior da Ponte D. Luís para a linha de metropolitano. Garante que só tem um objectivo: que sejam erguidas barreiras de segurança no local para evitar a perda de outras vidas. Aguarda uma sentença desde Janeiro e, mesmo que o tribunal não lhe dê razão, já conseguiu uma vitória: “O caso chegou a julgamento.”
Ainda hoje, este funcionário da Sociedade de Transportes Colectivos do Porto não consegue falar daquele dia, 5 de Abril de 2004, sem ficar profundamente emocionado. Continua a dizer que não tem a certeza se o filho, que trabalhava como fotojornalista e frequentava o 3.º ano do curso de Fotografia, se suicidou, se foi empurrado, ou se se tratou de um simples acidente. Não quer valorizar o pedaço de guardanapo em que Alfredo terá deixado uma última mensagem nem quer acreditar que tenha decidido matar-se por causa da antiga namorada, como concluiu o DIAP. O certificado de óbito registou a causa da morte como “indeterminada”. “É terrível”, pronuncia. A mulher nunca mais conseguiu trabalhar e está reformada por invalidez.
Ponte “amaldiçoada”?
Amadeu guarda tudo com um zelo de investigador. Exibe uma notícia publicada num jornal um mês e meio após a morte do filho, na qual uma moradora da Rua das Fontainhas diz que a ponte “está amaldiçoada”, tantos eram então os casos de quedas e suicídios. Para tentar perceber o que tinha acontecido, foi várias vezes ao local, fez croquis, fotografias, falou com pessoas que residem ao pé da ponte. Percebeu que a travessia já tinha sido palco de muitas quedas e suicídios desde a inauguração, em Março de 2003. “Algo está mal, não foi só o meu filho”, reflectiu. Decidiu que teria de fazer alguma coisa. Na altura, muitos tentaram demovê-lo: “Não se meta nisso, diziam-me.” Ele insistiu. Pediu um advogado à Ordem, que foi nomeando vários, que foram sucessivamente pedindo escusa. Até que a quarta, Sónia Pacheco, aceitou. E interpôs uma “acção administrativa comum” no TAF que visa “promover a defesa do interesse público”.
“A falta de segurança e de medidas de protecção efectivas levou a que, só no primeiro ano após a inauguração, se perdessem mais de 20 vidas naquela ponte”, refere a acção, que destaca, além da falta de vedações altas, o facto de os sinais de trânsito colocados junto ao gradeamento facilitarem “a subida para o parapeito”. A Metro, alega, limitou-se, na altura, apesar de alertada pela população, a retirar um dos sinais de trânsito e acabaria por retirar os restantes, alguns anos depois. A legislação sobre os gradeamentos nas pontes deve ser revista, concluiu a advogada.
“Ninguém discute a bondade de prevenir suicídios e quedas. O que a Metro do Porto diz é que nesta ponte (a única que construiu) respeitou todos os parâmetros legais. O que está em causa neste acção é saber-se se a altura do gradeamento [1,10 metros] é suficiente”, sustenta Joana Aroso, advogada da empresa. Os chamados guarda-corpos obedecem a regras e à partida estas foram respeitadas, diz. E lembra que a Metro até foi alertada pelo Tribunal de Contas para o facto de serem as autarquias de Gaia e do Porto as responsáveis pela manutenção da travessia. Mas as autarquias nunca se entenderam. “Quem é que tem responsabilidade pela prevenção de suicídios?”, pergunta. Amadeu também não tem resposta. Diz apenas que, em tribunal, uma testemunha contabilizou “mais de 70 mortes” na ponte. “Muitas podiam ter sido evitadas.”
Por Alexandra Campos in http://www.publico.pt/portugal/
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Ver conceito de guarda-corpos por Paulo Moreira Lopes
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Rede anti-suicídio para mudar história da ponte Golden Gate
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Pedido de esclarecimentos remetido ao LNEC, cuja resposta foi: “a matéria em questão não é da competência direta deste organismo pelo que sugerimos o contacto com o Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P..”
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Pedido de esclarecimentos remetido à AMT – Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, que aguarda resposta.