NO próximo dia sete de outubro, como todo brasileiro maior de dezoito anos de idade e residente no exterior, irei ao Consulado-Geral ― no meu caso, o de Tóquio ― para cumprir meu dever de cidadão: o de votar nas eleições para Presidente da República.
Muito bem: será mais de uma hora de trem até o local da votação. E, ainda que seja importante participar de um processo democrático, a verdade é que, mais do que o dever cívico, a razão que leva este cético brasileiro a sair de casa em um domingo para escolher entre o “péssimo” e o “pior” é esta: as possíveis sanções se não compareço às urnas nem justifico minha ausência. E entre tais sanções, claro, há a irregularidade do título de eleitor, o que, por sua vez, afetaria outros documentos ― como o CPF (Cadastro de Pessoa Física). Uma dor de cabeça, enfim, considerando a sempre incômoda burocracia que caracteriza os órgãos públicos da pátria mãe gentil.
De modo que essa obrigatoriedade, própria de países nos quais eleições significam, mais que um embate político, a luta por privilégios (daí o verdadeiro faroeste que testemunhamos nas redes sociais), torna-se mesmo um incômodo a quem, morando no exterior, pouco será afetado pelos resultados da eleição no Brasil. É o caso dos residentes no Japão: um país, aliás, onde fica fácil até esquecer-se de datas de eleições.
Um esquecimento normal, vale frisar, visto que, não sendo o voto obrigatório ― e sem o “horário eleitoral” a martelar diariamente a cabeça do povo para ir às urnas ―, muitos eleitores acabam mesmo passando a data “em branco”. Foi o que ocorreu com minha esposa: certa vez, enquanto íamos ao supermercado, ela, vendo algumas pessoas adentrando uma escola, em pleno domingo, perguntou-se: “Será algum festival?”. E, nesse instante, recordou: “Ah, sim: hoje é dia de eleição”. E, aproveitando que já estávamos próximo ao local da votação, entrou e marcou um nome qualquer. Depois, curioso, perguntei em quem ela tinha votado. E ela: “Marquei no único nome feminino que estava concorrendo”. E não se falou mais no assunto.
De minha parte, confesso, chego a sentir inveja desse descaso dos japoneses em relação às disputas políticas. Primeiro, porque o voto, como disse acima, não é obrigatório ― e, portanto, inexistem sanções aos que não comparecerem. E segundo, seja qual for o vencedor, a vida social (saúde, habitação e educação) pouco ou nada muda. Talvez apenas no quesito “impostos”, mas, ainda assim, nada que leve o povo ao desespero.
Claro, sei que tal descaso é impensável no Brasil, onde eleições sempre foram escadas para o oportunismo. Mas imagino como seria nosso país sem o voto obrigatório: no qual o eleitor tivesse o direito assegurado de dizer na data de um pleito: “Hoje, não quero sair de casa para votar!”. Aí, sim ― parafraseando Jobim ―, existiria mais verdade!
SOBRE O AUTOR: EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus (Amazonas-Brasil) em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta (2015), os dois últimos vencedores, respectivamente, dos Prêmios Orígenes Lessa e Vicente de Carvalho da União Brasileira de Escritores – RJ (UBE-RJ), em 2016. E, em setembro de 2017, seu livro, ainda inédito, “Crônicas de um Japão Caboclo” obteve, também pela UBE-RJ, o Prêmio Alejandro Cabassa. Foi também um dos autores premiados no Concurso de Poesia Agostinho Gomes, em Portugal, em 2017.
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