NO horóscopo chinês, o cachorro representa o décimo-primeiro signo – posição que corresponderia, segundo uma lenda, à ordem de chegada dos doze animais que compareceram quando convocados por Buda.
No que concerne ao Japão, o “zodíaco dos animais” também é utilizado para marcar a passagem para um novo ano: com a fundamental diferença de que, no caso japonês, o ano começa mesmo no dia primeiro de janeiro (oshogatsu); enquanto que, na China, a transição da segunda metade de janeiro para a primeira semana de fevereiro é que determina a troca do calendário.
Seja qual for o sistema adotado, o fato é que 2018 é deles: dos cachorros. E isso pude ver, claramente, nos templos que visitei no dia primeiro de janeiro. Mas, principalmente, no segundo deles: o Heian-jingu; que, apesar de possuir uma história bem mais recente que o Kumano (sobre o qual escrevi na edição anterior) e o Nanzen-ji (construído ainda no século XIII), tem grande importância para a cidade de Quioto ― pois, fundado em 1895, como parte do palácio Heian, o templo simboliza o período em que a cidade também era a capital japonesa. De modo que, no dia primeiro de janeiro, o Heian-jingu atrai centenas de visitantes. E foi lá, exatamente, que os cachorrinhos mais brilharam.
Falo cachorrinhos, pois foram os filhotes de akita-inu (uma das raças caninas mais antigas no arquipélago, semelhantes a um lobo) e chihuahuas os que mais atraíram os olhares dos visitantes do templo: com suas roupas (sim, roupas!), que variavam desde “Papai Noel” até camisas listradas ― no estilo “Irmãos Metralhas” ― e… saias de bailarina. Insano? Não para este observador, que, residindo no país há quase duas décadas, já se acostumou a testemunhar a verdadeira adoração que o povo local tem por um “inu” (cachorro, em japonês). E tal fascínio, diga-se, é histórico: por exemplo, consta que Tsunayoshi, o quinto Shogun da dinastia Tokugawa, baixou, em 1687, um decreto-lei, ordenando à população a tratar bem os animais, principalmente os cães. E, para garantir o bem-estar de seus amigos caninos, Tsunayoshi (que nasceu no ano de 1646; portanto, no “ano do cachorro”) chegou mesmo a criar um imposto: cujo valor arrecadado era destinado, totalmente, a garantir casa e comida a cada cachorro no Japão.
Talvez pelas traumáticas lembranças do governo de Tsunayoshi, os japoneses passaram a exagerar no bom tratamento dado aos caninos: chegando ao ponto de preparar festas de aniversário, casamentos e até contratar monges para os funerais de seus cãezinhos. Já os gatos, não recebendo a mesma atenção, vagam pelas ruas e lixeiras.
Por isso, deixo aqui o meu protesto: pela igualdade de tratamento entre cães e gatos no Japão… time’s up!
SOBRE O AUTOR:
EDWEINE LOUREIRO nasceu em Manaus em 20 de setembro de 1975. É advogado e professor de idiomas, residindo no Japão desde 2001. Premiado em concursos literários no Brasil e em Portugal, é autor dos livros “Sonhador Sim Senhor!” (2000), “Clandestinos” (2011), “Em Curto Espaço” (2012), “No mínimo, o Infinito” (2013) e “Filho da Floresta (2015), os dois últimos vencedores, respectivamente, dos Prêmios Orígenes Lessa e Vicente de Carvalho da União Brasileira de Escritores – RJ (UBE-RJ), em 2016. E, em setembro de 2017, seu livro, ainda inédito, “Crônicas de um Japão Caboclo” obteve, também pela UBE-RJ, o Prêmio Alejandro Cabassa. Foi também um dos autores premiados no Concurso de Poesia Agostinho Gomes, em Portugal, em 2017.
Página para contato: https://www.facebook.com/edweine.loureiro