QUANDO era pequena, tudo o que se passava à minha volta era pretexto para imaginar. A minha infância foi passada, na sua maioria, na casa dos meus avós sem companheiros da minha geração, pelo que esta era a minha maneira de conhecer outros mundos muito diferentes daquele que eu habitava. O meu avô era o cúmplice mais assíduo dos meus devaneios, preparando todo o tipo de adereços e cenários para que eu pudesse representar o papel de princesa, veterinária, cavaleira… Púnhamos a minha avó doida com a desarrumação no quarto! Escusado será dizer que, para além de ajudar-me a concretizar as minhas fantasias, o meu avô lia-me muito, durante muitas horas. Foram anos a fio repletos das mais exuberantes histórias, por entre livros que, ao folhear, deixavam no ar o tão característico odor de uma obra que repousa na estante há muitos anos. O aroma da literatura intemporal. Apaixonei-me por esses momentos. Pela ânsia de descobrir mais, pelo nervosismo que antecedia o desvendar do enredo. Foi um amor de perdição, que ainda hoje se mantém. E é essa a verdade do amante de livros. Nunca deixaremos de procurar a sua companhia.
Aos quinze anos, e depois de muitos contos escritos, decidi que chegara a altura deembarcar num projecto mais ambicioso e daí surgiu o Desafio Celestial. Um sábado vi-me perdida em reflexões e surgiu-me a seguinte questão: “Se Deus é o único ser perfeito, então como serão os anjos?”. A partir deste momento soube que queria explorar melhor o imaginário que diz respeito a estas criaturas e aproximá-las do ser humano comum. Acabei-o aos dezasseis e depois de o enviar para várias editoras, este foi publicado pela Editorial Presença em 2011.
Assim que o acabei soube que o imaginário que introduzi no primeiro livro, principalmente o seu lado mais negro, ainda podia ser mais trabalhado e, por isso, comecei a escrita do livro que agora apresento, Odisseia Celestial – Os orbes do conhecimento (2013), em E-Book. Infelizmente não o pude ver editado em papel, por enquanto, mas não podemos baixar os braços perante a adversidade. Por outro lado, preciso desta forma de terapia eufemizada que é a escrita, pois sinto uma grande necessidade de controlar o mundo à minha volta e na escrita posso fazê-lo sem restrições.
Se têm uma história que querem contar, façam-no. A escrita é um trabalho de paciência, com muita transpiração à mistura e com frutos que demoram muito tempo a nascer. É algo que um futuro autor tem de aceitar. Contudo, é um dos maiores prazeres da vida. É algo que nasceu de nós. São filhos feitos de palavras.
Por Inês Maia publicado in O tempo entre os meus livros