PODIA dizer que escrevo os livros que gostava de ler, ou de ter na prateleira da minha biblioteca, mas isso parece-me muito presunçoso e, ao mesmo tempo, um pouco afastado da realidade. Escrevo porque leio. Penso que quando se lê muito acaba por ser o passo natural. Escrevo também para responder às minhas próprias dúvidas e perguntas.
A forma como escrevo é muito sensorial. É quase como ler com a diferença de que tenho de escrever se quiser saber como continua a história… literalmente.
Quando parto para a escrita propriamente dita, já conheço todos os factos históricos, não voltarei a ler sobre eles. As personagens têm como missão contar a história aos leitores e a mim. Nunca sei como o vão fazer. É um mistério. No meu género isso pode ser problemático, pois é difícil escrever sobre personagens que têm a sua própria agenda. Acho que elas conspiram contra mim… as personagens. Têm o seu próprio plano e não estão interessadas em contar-mo. É como uma luta pela sobrevivência em que cada um vive por si, ainda que, simultaneamente, estejam todos unidos contra quem escreve as suas vidas. É um desespero.
Num enredo tão intrincado, ligado por todos os lados, com histórias que vivem aparentemente separadas mas hão-de unir-se algures, é um exercício louco escrever da forma que escrevo, mas já dizia Rubem Fonseca que os escritores têm uma dose muito grande de loucura. Penso que ele tem razão.
Por Luís Miguel Rocha publicado in O tempo entre os meus livros