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Aureliano da Fonseca, 100 anos

Aureliano da Fonseca, 100 anos

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PEDIR a Aureliano da Fonseca que escolha a música ou o livro da sua vida é quase tão difícil como encontrar um espaço vazio entre os livros e mochos de múltiplas cores e feitios que povoam as paredes do seu escritório. Não é por acaso. Aos 100 anos, o Saber não ocupa lugar no histórico médico, antigo estudante da U.Porto e autor do tema “Amores de Estudante”. De um Sêneca disfarçado de mocho acena a citação: “A natureza deu-nos o engenho da curiosidade”, mas é Aureliano quem remata: “A coisa mais maravilhosa que eu encontrei na vida minha vida foi a capacidade de pensar”.

Nascido a 25 de fevereiro de 1915, Aureliano da Fonseca licenciou-se pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) em 1940, concluindo o doutoramento na mesma instituição em 1964. Ainda como estudante, é responsável pela reativação do Orfeão Universitário do Porto, em 1937, e pela composição de temas emblemáticos do universo estudantil, com destaque para “Amores de Estudante”, reconhecida como o hino dos estudantes no Porto e em todo o país.

Foi também na FMUP que iniciou a carreira de docente, em 1950, ali permanecendo até 1977, ano em que ruma ao Brasil para dar aulas na Faculdade de Ciências Médica da Universidade de São Paulo, onde reorganizou o ensino de Dermatologia e estruturou o Serviço daquela especialidade no Hospital Universitário. Autor de milhares de “paper”s em conceituadas revistas médicas nacionais e internacionais, pioneiro em Portugal na área da Educação Sexual e membro honorário de 11 sociedades médicas, nunca abandonou a prática médica, tendo dado consultas da sua especialidade até 2013.

Apaixonado por fotografia e música, dedica hoje boa parte do tempo a escrever as suas memórias e outros flashes de “uma vida a sentir”. Foi desse exercício, onde as palavras expressas se propagam por ideias esboçadas ou ocultas, que nasceram “100 Anos Cem Versagens”, livro lançado em março passado, por ocasião das celebrações dos seus 100 anos de vida.

Naturalidade: Porto

Idade: 100 anos.

– De que mais gosta na Universidade do Porto?

Do edifício da Universidade, atual Reitoria. Acho lindo!

– De que menos gosta na Universidade do Porto?

De nada!

– Uma ideia para melhorar a Universidade do Porto?

O Professor da Universidade tem que ser cada vez mais um despertador de interesses. Ele não tem que ensinar nada, absolutamente nada. Ele tem é que despertar interesse em cada aluno, contar histórias que o motivem a querer saber e explorar mais. Se a pessoa tiver interesse, vai ao fim do mundo. Mas ainda hoje há professores que têm um livro à frente e lêem o livro na aula. Isso não é nada. Então que dêem o livro aos alunos… O professor tem é que contar histórias que motivem ao aluno, que façam pensar, que gerem espírito crítico. Infelizmente esse modelo de responsabilização não está generalizado em Portugal.

– Como prefere passar os tempos livres?
Continuando a fazer aquilo que devo fazer. Não há tempo livre.

– Um livro preferido?

Todos aqueles que me interessam e que tratam assuntos que me agradem.

– Um disco/músico preferido?

Gosto muito de música clássica. Mas deixo-me inspirar por toda a música que me ensina, que me eleva, que me entusiasma, e isso é variável no tempo e conforme o meu estado de espírito.

– Um prato preferido?

Eu nunca escolho o que como, escolho o que me dão. Eu vou a um restaurante e pergunto; o que é que está feito? É isso que eu como!

– Um filme preferido?

Depende da idade. Quando era jovem, gostava muito dos filmes de cowboys. Hoje gosto de todos os filmes que me obriguem a pensar.

– Uma viagem de sonho (realizada ou por realizar)?

Eu gosto muito de viver, e viver é viajar. Eu gosto de viajar na vida. Todo o mundo é belo quando olhamos para ele com necessidade e humildade.

– Um objetivo de vida?

Continuar a ser capaz de escrever as ideias que me surgem. É um trabalho que nunca está completo e que se vai modificando à medida que nós próprios vamos modificando.

– Uma inspiração? (pessoa, livro, situação…)

Tudo o que vejo na vida e que me agrada é motivo de inspiração. Sempre foi assim, desde pequeno.

– Uma memória especial dos tempos de estudante…

Quando, juntamente com outros estudantes verdadeiros (porque também há estudantes falsos), fizemos despertar o Orfeão em 14 de abril de 1937, através da criação da tuna e da orquestra de tangos. Em seis semanas, organizamos 200 rapazes e 50 raparigas, que pela primeira vez se apresentaram a cantar, o que foi inédito no país.

– Um desejo para o futuro da Universidade…

Que ela seja cada vez mais Universidade, mais Universal, procurando desenvolver o Saber na comunidade. Mas o Saber que não tem um tempo, que não tem pátria. Os Amores de Estudante falam disso: “Quero ficar sempre estudante para eternizar a ilusão de um instante”. E essa Ilusão é o Saber, porque ele nunca tem fim.

Por Tiago Reis publicado in http://noticias.up.pt/

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