MARIA Alice de Sousa Peixoto nasceu no Porto, em Dezembro de 1929. Filha de comerciantes de mercearia e venda por grosso em Armazém, trabalhou na Companhia de telefones, foi campeã Regional e Nacional de Natação e tornou-se pintora autodidacta. Vive há 10 anos na Póvoa de Varzim, destino que visitou durante décadas aos fins-de-semana. “Os meus pais tinham posses para eu continuar a estudar, mas eu só completei a 4ª classe. As mulheres do meu tempo eram para as panelas e lida da casa. No entanto, aprendi os labores das meninas de bem: costurar, bordar e tocar piano. Também dava uma ajuda na mercearia. Aos 17 anos fui empregada da Companhia Anglo-Português Telefónico, que era dos ingleses. Pouco mais de um ano depois, voltei para casa para a vida doméstica. Como o meu tio era professor de natação do FC do Porto levou-me para a modalidade. Em 1952, fui campeã regional nos 100 metros costas e regional e nacional nos 100 metros estafetas. Vivi sempre numa redoma e tive uma infância e uma juventude muito feliz. Na minha juventude era chique passear na avenida do antigo Palácio Cristal, onde passei muitas festas de carnaval e fui a alguns casamentos. Ainda hoje me interrogo como foi possível demolir aquela beleza de edifício”.
Maria Alice, que para o mundo das artes plásticas é conhecida por Malice, recorda os primeiros passos na pintura: “ embora gostasse de desenhar não sonhava ser pintora. Já depois de perder a minha mãe, ia fazer 49 anos, quis aprender umas noções de pintura e inscrevi-me numa escolinha do Porto. Sempre que tinha um lápis e um papel aparecia uma flor. Por isso, quando comecei a misturar óleos na tela foi flores que surgiram. Daí resultou uma primeira exposição colectiva num hotel do Porto. Para meu espanto vendi alguns quadros. O que começou por ser uma brincadeira tornou-se numa coisa séria. Nunca mais parei de pintar”. E acrescenta: “comecei a ser convidada para fazer exposições. Já expus em imensas cidades do norte do País e Trás-os-Montes, no Casino, na Filantrópica e no posto de Turismo da Póvoa. Só uma família comprou-me 70 quadros, e duas senhoras compraram 50. Mas tenho muitos admiradores que nas suas casas tem 20 ou 30 telas minhas”.
Malice pinta as flores do jardim da sua criação: “no início punha um jarro com flores a servir de modelo. Só pintava as flores e acrescentava outras que não estavam no jarro. Comecei a notar as diferenças entre as flores que eu copiava e as que livremente imaginava. E a desobediência era muito mais bela. A partir daí comecei a libertar flores da minha cabeça, algumas nem conheço, estão comigo, brotam de forma espontânea e gestual. Dou uma pincelada e nasce uma pétala, depois as cores passam por cima umas das outras, misturam-se na tela sem receio. As transparências conseguem-se desta forma e as flores nascem sem medo. Pintar é deixar de ter medo. Pintei sempre a óleo e faço as misturas de cores directamente na tela. Só uso a paleta para ter as tintas. A pintura tem uma personalidade muito forte, só sai o que quer e quando quer. Algumas vezes fui para a tela pintar e não me saia nada, tinha que parar. Outras vezes tinha que continuar a pintar”.
Por José Peixoto. Leia a notícia na íntegra na edição impressa da A VOZ DA PÓVOA