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A Elionor de Miquel Martí i Pol

A Elionor de Miquel Martí i Pol

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A Elionor tinha
catorze anos e três horas
quando começou a trabalhar.
Coisas como esta ficam
registadas no sangue para sempre.
Ainda usava tranças
e dizia: «sim, senhor» e «boas-tardes».
As pessoas gostavam dela,
da Elionor, tão terna,
que cantava enquanto
passava a vassoura.
Mas os anos dentro da fábrica
diluem-se no opaco
cinzento das janelas,
e em pouco tempo Elianor já não saberia
dizer porque lhe dava
vontade de chorar
nem de onde lhe vinha
aquela irreprimível
sensação de estar só.
As mulheres diziam que o que se passava
era que ela estava a crescer e que aqueles males
se curavam tendo marido e crianças.
A Elionor, de acordo com a muito sábia
predição das mulheres,
cresceu, casou e teve filhos.
O mais velho, que era uma rapariga,
tinha feito catorze anos
há apenas três horas
quando começou a trabalhar.
Ainda usava tranças
e dizia «sim, senhor» e «boas-tardes».

in Resistir ao tempo antologia de poesia catalã (edição bilingue), organização e tradução do catalão de Àlex Tarradellas, Rita Custódio e Sion Serra Lopes, Assírio & Alvim, junho 2021, página 405

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