HÁ muito de fantástico no bailado das nossas vidas. Houve épocas em que vivemos de forma alucinante num frenesi que surpreendeu o próprio mundo, tentando adquirir bens materiais que nos permitissem permanecer para sempre neste planeta, cercados de bem-estar e riquezas.
E o tempo vai passando, modifica aqui, transforma acolá, sem qualquer espécie de compaixão pelos seres vivos, vai fazendo a sua mortandade. Muitos da minha geração, ficaram ao longo do caminho vencidos por estranhas doenças, desastres ou modos de viver inadequados. As chamadas circunstâncias da vida de quem ninguém foge, ditam a sorte de cada um.
Já passaram muitos anos desde que se iniciaram as nossas primeiras brincadeiras infantis. Crescemos. Depois veio a escola, dias longos de aprendizagem interrompidos no Natal, no Carnaval, na Páscoas e nas grandes férias de Verão na praia da Granja, Espinho e Francelos, alguns anos também, nas areias das Praias dos Ingleses e do Homem do Leme, na Foz do Douro. Em setembro, encerrávamos o Verão com um magnífico por do sol em Moledo do Minho porque como jovens, trazíamos a crescer dentro do peito o desejo permanente de mudança. Nesse período, infelizmente nenhum de nós, rapazes e raparigas, nos preocupamos em conhecer a história desses locais por onde despreocupadamente nos veraneamos O que nos interessava eram os mergulhos nas ondas que o mar trazia, cobrindo de espuma os nossos bronzeados corpos ainda em plena formação, e saborear uma bola de Berlim sob a inclemência do sol de Verão.
Agosto entrou há poucos dias pela terra e pelo mar dentro. Há outras ondas, quase iguais às perdidas nessas beira-mares distantes dos nossos dias de felicidade, mas nelas falta muita gente estendida na areia, ou abrigada nas barracas às riscas coloridas perfiladas na orla marítima. Pessoas que nos amavam, outras que apenas encontrávamos nesses dias, mas que nos estimavam com a sua amizade como se fôssemos tesouros de inestimável riqueza, e nos abrigavam os corpitos molhados com as toalhas que a afeição ia tecendo.
Lembrei hoje, nas vésperas em que tudo nos vai parecer exactamente como nesses dias perdidos na neblina da memória. O sol, o mar, as ondas, as morenas e finas areia do Litoral Norte e até as gaivotas que sobrevoavam a nossa adolescência, vão estar presentes nessa minha imaginária, mas deliciosa lembrança dos antigos quentes dias de Agosto.
Lembro-me sim desses momentos sem nuvens na atmosfera e dentro do meu peito. É como se um barco da cor deste céu azul que hoje cobre o mar e as terras do Norte do meu país, aproasse a um cais perto daqui e nele viessem todas as pessoas que me fizeram felizes nesses Verões do passado, para me abraçarem junto às abençoadas águas do mar da minha adolescência e juventude.
Manuel Araújo da Cunha (Rio Mau, 1947) é autor de romances, crónicas, contos e poesia. Publicou: Contos do Douro; Douro Inteiro; Douro Lindo; A Ninfa do Douro; Palavras – Conversas com um Rio; Fado Falado – Crónicas do Facebook; Amanhecer; Barcos de Papel; Casa de Bonecas e Crónicas de outro Mundo.
Uau!!! Que lindo … viajei com você nesse tempo, nesse tempo tão feliz da tua juventude , plena de amigos (na orla marítima) , lazer, paz, beleza, natureza revbestida de bondade das águas do mar que cobria os corpos , naquelas ondas maravilhosas … Saudades desse tempo … Muito Obrigada pela partilha! Abraços, aqui de Santa Maria/ Rio Grande do Sul, Brasil … dia 03 de Agosto de 2022…