7.
trago dentro de mim um mar imenso
feito de vagas tristes
e sonhos vagos
o horizonte é uma manhã
que eu quis minha para ser eu
e para porto de abrigo escolhi uma tarde
que soubesses chorar a morte do sol
6.
Perdemos aqui um lugar para o silêncio.
Veio a morte e havia ainda palavras
e o dizer obscuro dos augúrios, escorços,
pequenas infâmias.
Olhaste-me com palavras.
E eu pensei que a mecânica do absurdo
cairia como o alfabeto morto
de uma natureza morta:
a tua morte, a minha morte.
Só as palavras sobrevivem
quando perdemos um lugar
para o silêncio. →
in “Ângulo morto” [2019]
5.
O que dirá de mim o meu deus,
pergunto, se eu guardar do pobre
apenas a melancolia.
O que dirá de mim, pergunto,
se eu pendurar a lira
no bengaleiro em flor
deste declínio. →
4.
Houve um tempo em que eu desconhecia o medo.
Deus ainda amava os filhos dos homens
quando, anos mais tarde, parou de chover.
Caiu-te um livro das mãos como um presságio. →
3.
Amo-te como buganvílias caídas ao redor
das casas ou o luar branco dos caminhos,
ou a substância audível da tua respiração. →
2.
Pousado no arcaz o fogo, como nas mãos de Caim,
o âmbar, os pântanos, os plátanos, um planisfério →
1.
Os filhos são insectos de alabastro
nas noites de insónia das mães →