1.
O ESPELHO DA ENTRADA
A rica mansão tinha na entrada
um ‘spelho enorme muito antigo;
comprado pelo menos há oitenta anos.
Um rapaz muito belo, empregado de um alfaiate,
(atleta amador aos domingos)
estava ali de pé com o pacote. Entregou-o
a alguém da casa, que foi lá dentro
a buscar o recibo. O empregado
ficou só, esperando.
Aproximou-se do espelho e mirando-se
ajeitou a gravata. Cinco minutos depois
trouxeram-lhe o recibo. Pegou nele e foi-se.
Mas o espelho que tanto e tanto tinha visto,
nesses seus muitos anos de existência,
milhares e milhares de coisas e rostos;
mas o espelho agora deleitava-se
orgulhoso de sobre si ter recebido
a beleza perfeita por alguns minutos
2.
CANDELABRO
Num quarto pequeno e nu, quatro paredes somente,
recamadas de muito verdes panos,
um belo candelabro brilha incandescente;
e em cada uma das chamas se acende
uma lúbrica paixão, um lúbrico ardor.
Nessa pequena alcova, que ilumina refulgente
a forte luz que vem do candelabro,
não é vulgar fogo esta luz ardente.
Não foi feita para os corpos tementes
a volúpia que há neste calor.
3.
À ENTRADA DO CAFÉ
A minha atenção, algo que a meu lado alguém disse
voltou-a para a entrada do café.
Vi então aquele formoso corpo que parecia
tê-lo criado Eros do fundo da sua experiência,
modelando com deleite a simetria dos seus membros;
erguendo, escultural, seu alto talhe;
modelando com ternura o rosto
e deixando-lhe, só com o toque das mãos,
uma emoção na fronte, nos olhos e nos lábios.
tradução de Manuel Resende
Konstantínos Kaváfis (Alexandria, 29-04-1863 – Alexandria, 29-04-1933) foi um poeta grego, considerado o maior nome da poesia em idioma grego moderno. O poeta grego Kostís Palamás considerava que a poesia de Kaváfis não era poesia, mas jornalismo, e Kaváfis retribuía e dizia que a poesia daquele era romântica.