DE facto, são cinzentas, a cor do vago indefinido neutro. Não interessa, é apenas uma questão de tonalidade mais ou menos carregada. Contudo, são bem diferentes estas caixas: as duas do plano primeiro são coisas de pouca estima, contentores de lixo com rodas, sujos e com cada vez mais mossas, desengonçados por via da pouca delicadeza e estima com que se lhes toca ou se lhes fecha a tampa. A mosca varejeira dedica-lhes tempo e minudência; os ratos acomodam-se na sombra ou nas moitas rasteiras esperando que alguma coisa apareça para exercitar o dente.
Outro assunto é a grande caixa ao fundo. Favorece-a o enigma das suas paredes cegas, o rigor da construção, o gigantismo, a solidão, o azul do céu e as nuvens um tanto esfarrapadas que lhe dão um fundo de leveza atmosférica a contrastar com a densidade da matéria do grande cubo. É o Data Center, como se pode ler no cartaz – O Data Center PT de última geração, inaugurado em setembro de 2013 na Covilhã, posiciona Portugal a nível mundial na capacidade de alojamento e gestão de infraestruturas TI (Tecnologias da Informação) e Cloud Computing, de forma inovadora e eficiente.[1]
Feitos os devidos ajustes de tamanho, poder-se-á dizer que os dois contentores da frente não foram inaugurados, não posicionam Portugal na vanguarda, não são inovadores e só muito razoavelmente são eficientes na função de alojar lixo; não suscitam nenhuma palavra em estrangeiro, garbage container center, e só farão parte do cloud computing quando tiverem uns sensores de odores e de nível de capacidade de armazenamento que, funcionando devidamente, recolham, processem e enviem indicadores, big data, sobre o seu estado. Então sim, serão de última geração em matéria de infraestrutura de manipulação do resíduo fedorento.
Muitos dizem que a outra caixa do Data Center também caminha a uma velocidade cúbica para a implosão por excesso de informação inútil acumulada, dissipada, sobre-abundante, anacronicamente armazenada para lá da sua temporalidade útil, transformada em nuvem, esfarrapada, infinita, rarefeita, asfixiante. Não se sabe ao certo. A informação era tida como coisa preciosa, que representava o próprio conhecimento, a inteligência, a capacidade de pensar e agir de modo justo e adequado (pois…, nem sempre). Ao contrário, a desinformação relacionava-se com a capacidade de distribuir informação tóxica. Uma e outra eram entendidas como matéria-prima do poder (a contrainformação, também).
Dizem-nos agora que o excesso de informação nos congestiona a memória e o discernimento, que nos faz mais distraídos, confusos ou angustiados. Registar ou esquecer, eis a questão. Muito distraimento anestesia o cidadão; muita confusão impede-o de pensar; muita angústia pode torna-lo ressabiado ou indignado mas isso só lhe azeda a existência e pouco lhe resolve.
Por Álvaro Domingues autor de A Rua da Estrada.
[1] https://cloud.ptempresas.pt/Pages/Datacenter/DCC.aspx