O MUNDO perdeu a cabeça. Não é para brincar. A cabeça e, por vezes, um ou outro membro. Assim é revelado em Lusaka, capital da distante Zâmbia, onde por entre a poeira dos dias, escaparates bem improvisados sublinham ingenuamente a realidade vivida aqui e ali.
Na penumbra do tórrido quotidiano aguarda-se pela potencial clientela que passa a velocidades moderadas. Neste stand vendem-se os últimos modelitos, e não supostamente por “liquidação total”. Trata-se de modelitos também encontráveis nas ruas de Pequim, Ancara ou Quito. A isto, chamam-lhe, entre outras coisas, globalização. E os vestidos, ostentados por manequins caucasianos, acompanham-se com cebola, em sacos de dez quilos, de forma a que o choro seja disfarçado com motivações várias e de catárses outras.
Por entre o espaço de vendas entrevê-se um cartaz do britânico Barclays Bank. Conhecido por ter financiado o regime do Apartheid da África do Sul (“Boerclaysbank”), pelo envolvimento em lavagens de dinheiro em África e noutras latitutes, por colaborar com o tiranete vizinho, Robert Mugabe, mas sobretudo por continuar a financiar e estar directamente envolvido no comércio de armas ao nível global. Armas que não desmembram ou decapitam manequins avitrinados mas gente de verdade.
As estradas e cruzamentos anónimos oferecem mensagens mais ou menos subliminares, ilustrando as complexas ligações entre cá e acolá, e de como o mundo perdeu cabeça.
Texto de Pedro Figueiredo Neto