VENDO bem não se sabe argumentar de forma muito clara sobre o que está em jogo na barragem do Tua. Ao preço que a electricidade está e sendo a EDP uma empresa privada que resultou da venda de bens e serviços públicos, é fácil fazer curto-circuito e faísca de alta voltagem com este assunto. Sendo capital chinês, pior, porque essa terra entre o socialismo pretérito e o capitalismo sem freio, não é propriamente um bom exemplo. Visto do Tua, o que se está a passar mais parece um duplo colonialismo: desta terra vazia as águas produzirão energia para gastar algures e transferir lucros para outras paragens. É tal qual. Tudo o que sabíamos sobre solidariedade entre sociedades e territórios se complica ainda mais quando não é o Estado-Nação que está a gerir a contenda mas a folia global do capital em frenética turbinagem. Em Junho de 2015 o Tribunal de Contas foi pouco simpático com o governo que liderou a privatização da EDP e com o Banco Espírito Santo (que nos deu tantas alegrias) que trabalhou para os dois lados. Para que serve o Tribunal de Contas?
Ao contrário, os argumentos ambientalistas parecem-me a confusão do costume. Como ambiente pode ser, literalmente, tudo, qualquer facto pode construir retórica para qualquer coisa: morcegos, ratos, água, árvores, humidade, secura, pedras, cobras e lagartos, micro-organismos e galáxias podem preencher longas listas de pseudo-factos sobre os quais nunca saberemos que tipo de cataclismos produzirão neste planeta que é ele próprio um cataclismo desde nascença. O planeta e a humanidade são habitualmente referidos, tais como as populações locais. O primeiro é uma esfera às voltas, o outro não se sabe o que é e quem o representa; não se constituindo como parceiros políticos também não valerá a pena incluir esses dois na equação porque só iam causar ruído. As populações locais são apenas listas de atestados de residência e registos de propriedades. Postos cada um a falar, saem as mais diversas razões, acordos e desacordos, desde os que dizem o politicamento correcto mas pensam outras coisas, os indiferentes, os ressabiados, os que para defender os seus interesses dizem que representam o interesse de todos, o que tinha uma escarpa de pedras e recebeu bom dinheiro e o que tinha umas vinhas e oliveiras e ficou sem elas.
Para todos existe um poste electrónico cheio de altifalantes à beira da estrada que gritará por milhões de decibéis em volta se o muro da barragem se estraçalhar. Que fujam os que estão na frente. As populações locais estão atrás. Porque a retórica ambiental fala de coisas muito sérias misturadas com bagatelas que pouca gente entende, corre um risco permanente de bradar no deserto onde o impacto ambiental é muito reduzido devido à areia e ao vento.
Por Álvaro Domingues autor de A Rua da Estrada.