Olho da janela,
lá fora desponta Março,
outro medo na ilha.
As ruas molhadas
que percorro com o olhar,
desdias de tempo.
Havia dois melros
perto de uma ribanceira,
as giestas florem.
*
Uma rapariga
que traz Junho pela mão,
pela asa que quebra.
Às vezes a fome:
a verdade ou consequência,
seara de trigo.
Consome-se o lume,
que fogueiras não dão frutos,
que dia é hoje?
*
No mês de Setembro
o vento que seca as fontes,
abriu-se a porta.
A folha amadura
dentro da luz que a entardece,
ares invisíveis.
Enquanto abre o fruto
que amadura na romãzeira,
a dor da lembrança.
*
Se celebro a luz
na escuridão de Dezembro,
oculto no bairro.
Descontentamento:
à vista do temporal,
morte meia cinza.
Hoje havia um gato
preto que salta na rua
e vinte vinte e um.
Texto de Óscar Possacos e ilustração de Alexandre Morais
Óscar Possacos (1962) é natural de Sendim da Ribeira, Alfândega da Fé. Por ora vive em Paredes. Com formação inicial em arquitetura exerce a atividade de professor de educação visual. E é poeta. Publicou “Lugar Quebrado” em 1982 e “Húmida Viagem” em 1984, tendo esta última obra poética sido distinguida com o Prémio Nacional Juvenil Ferreira de Castro. Recentemente deu à estampa “Cantaria” onde revela que estamos onde somos.
Alexandre Morais (Bonfim, Porto, 1952) licenciou-se em Artes Plásticas/Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e exerceu a docência (educação visual) até 2018. Participou em inúmeras exposições, individuais e coletivas. Atualmente, está associado à Galeria Olga Santos, no Porto.